Maputo, 31 de Dezembro de 1998
Hoje é o último dia do ano. Um dia passado na mais perfeita solidão apesar de estar contigo. Ou de ser suposto estar contigo porque foi por ti que vim, mas tu, tu não estás nem aí. Estou e sinto-me só, o que é uma contradição. À minha volta há dezenas de pessoas, gente de todas as cores, tamanhos, feitios e idades. Falam uma variedade de idiomas, riem, conversam, discutem ou namoram-se. E eu, estou sozinha num sítio onde não conheço ninguém e ninguém me conhece, a não seres tu. Ninguém se importa sequer com isso mas também não era suposto que alguém, a não seres tu, se preocupasse.
É estranho este ambiente que está a ser recriado à beira desta piscina magnífica, dando uma imagem de festividade sem que eu sinta que posso, por algum momento, fazer parte dela. Sinto-me uma pateta alegre por ter vindo fazer uns bons milhares de quilómetros para a terra das acácias de flor vermelha, onde a água rola ao contrário nos lavatórios e até as estrelas têm no céu uma imagem desconhecida para mim. E fi-lo por ti, para ti, mas não quero, por um segundo que seja, que o percebas. Esperava-te diferente, é verdade, mas se não estás, não quero que fiques e que me enganes mais.
De pensar que apenas cheguei ontem e já estou arrependida. E sabes porquê? Porque me fazes sentir a mais, depositando-me aqui e eclipsando-te sem uma palavra. E de pensar que foste tu que insististe para eu vir, fazendo projectos.
O calor sufoca-me e cala as palavras que gostaria de dizer e as gargalhadas que tinha necessidade de dar. Mas não há condições para o riso aberto, franco e descontraído. Pode ser que tudo mude como o tempo, afinal hoje também já fizeram muitos tempos: sol e calor abrasador como no verão; trovoada e chuva como no Inverno... só que sem frio.
Diz-me, o que faço eu aqui? – pergunto-te em silêncio, sem emitir um som que seja. Olho-te, quando apareces, quase sempre de fugida, e querendo dizer-te tanto, calo-me...