Ando numa fase cansativa em que as arrumações são a minha prioridade. Não arrumações em sentido figurado, mas sim tudo o que tem que ver com a limpeza e a recolocação dos objectos nos sítios depois das obras necessárias após o incêndio em Março. É engraçado perceber que a casa tem mais coisas do que devia porque agora já não sei bem os sítios de cada peça e sobram-me algumas... Não tenho jeito para engenharia, portanto.
No meio do cansaço houve uma tarefa que me deu um infinito prazer: a caixa onde tinha guardado as minhas conchas e os búzios trazidos de África, uns apanhados nas longas caminhadas pela praia, outros oferecidos e uns quantos comprados. Todos têm um significado e uma história, desde os mais pequenos aos maiores. E todos, sem excepção, me fazem sorrir. Afinal, enquanto por lá andei, tratei um por um com um carinho e atenção particulares. Lavei-os, esfreguei-os, limpei-os, envernizei-os e sequei-os cuidadosamente.
E hoje retirei-os do caixote, desembrulhei-os, de novo um por um, e voltei a limpá-los. Ao pegar-lhes, as imagens vividas passaram à frente dos meus olhos com uma estranha nitidez: foram momentos vividos há tempo mas pareceram-me ainda muito presentes. E as personagens reapareceram: o companheiro, o amigo e as amigas, as falsas e interesseiras conhecidas, as falaciosas confidentes, o intriguista, os vendedores.
E pela proximidade das memórias, tentei ouvir o som do mar na boca dos búzios mas a distância imperou e não me deixou escutá-lo.