Ele insistia em dizer-lhe que a amava, apesar de tudo: dos desencontros que o destino tinha repetido, da distância em que tinham vivido, das diferenças que os distinguiam, dos modos de vida que não os aproximavam, dos gostos e dos desejos que não se encontravam, do tempo que os ausentara um do outro... Mas ele repetia, sem se cansar, que a amava. E ela não acreditava...
Ele queria acreditar que a amava e queria efectivamente amá-la. Porque ela tinha uma vida certinha, porque tinha ideais e sonhos e desejos, e não se importava de viver sózinha se nunca chegasse a encontrar o que procurava. Se não tivesse a vida que idealizara conformava-se, mas dizia com um sorriso aberto e cheia de confiança que não queria "embarcar" numa vida de incerteza. Magoara-se demais e não queria repetir a proeza. Os custos eram bem mais elevados do que os benefícios, disso tinha certeza e o prazer que podia retirar de uma "história de conto de fadas" rapidamente se transformava num inferno. E climas tórridos só no verão ou em África, pensava.
Não, ela não era particularmente bonita, nem assustadoramente feia. Tinha traços simples marcados por um nariz "cheio de personalidade", não era exuberante e procurava passar despercebida. Tinha uns olhos ternos e compreensivos, que evidenciavam algum cansaço, de uma cor difícil de definir porque variava com os estados de alma. E falava com os olhos, dizia quase tudo, o que sentia e o que pensava. E quando não podia dizer, olhava para baixo ou para longe, ou fingia pensar, para que a expressão do olhar não a traisse.
Era suficientemente inteligente para acreditar que quanto mais sábio se é, mais simples se parece, e vivia de acordo com a permissa, sempre pronta para aprender com todos, porque a grande sabedoria não está nos livros mas nas experiências de vida. E a vida dela estava bem marcada pelo factor experiência. Talvez por isso quisesse viver em paz com ela própria e com os outros.
Era uma pessoa tranquila e, para ele, representava a diferença, o que ele não tinha. Por isso, queria amá-la e convencia-se a si próprio de sentimentos que não tinha, mas que queria ter. Não, não se convencia mas dizia que sim, porque pensava que assim era mais fácil convencê-la. E enganava-se porque ela percebia. Isso e muito mais. Quando o ouvia com declarações de amor sem fim tentava contrariar a tendência e quando não era bem sucedida calava-se, ouvia-o e olhava-o calmamente. Mas a cabeça fervilhava de perguntas, para as quais ele não tinha respostas e por isso repetia palavras de amor, de desejo, de procura de entendimento, de conforto e de compreensão.
E ela ouvia até à exaustão pensando que lhe queria perguntar - Mas afinal, o que é para ti o amor?