Ao fim de muitos anos o meu coração apaziguou-se, talvez tenha feito as
pazes com a Terra... Em boa verdade, não foi com a Terra porque nunca esteve
zangado com ela. Nem com a Terra nem com as gentes e por isso senti sempre
vontade de regressar. Apaziguou-se com ele próprio, e depois comigo, tranquilizou
os ímpetos, amainou as vontades mais escondidas por trás de uma aparente
felicidade. Durante anos não fora um coração feliz; foi ansioso por qualquer
coisa que procurou infinitamente sem encontrar e que julgava que ali poderia estar.
Foram buscas sem fim, encontros de equívocos que resultaram em (des)enganos
incompletos, tristes, sem sentido.
Por fim, depois de tanto tempo, olhar para o presente sem regressar
inevitavelmente ao passado era uma vitória pessoal. A certeza da vontade era
que nada mais do que foi deveria regressar. Cada experiência era isso mesmo: uma
vivência única e irrepetível, e o que lá vai já foi. Não queria que o passado
fosse apagado. Cada minuto antes vivido faz parte de mim e conduziu-me ao que
hoje sou. Mas a vontade de reviver o que se esgotou há muito desvaneceu-se,
desapareceu envolta em névoa. De repente tive a sensação de que todos os encontros
e momentos vividos, felizes ou não, merecem apenas ser lembrados como se de um
conto se tratasse. Ao revisitar alguns locais apeteceu-me apenas rever essas
lembranças começando o descritivo da memória com a frase: "Há muito muito
tempo passei uma longa temporada aqui...".
Agora, mais do que nunca, sinto o coração apaziguado, tranquilo,
descontraído e o que me dá essa certeza é que posso vir e partir para de novo regressar
sem correr o risco de viajar aos pedaços. A cada vez que retornar e voltar a
sair faço-o inteira sem deixar parte do meu coração por ali perdido...
São Tomé, 10/09/2014
São Tomé, 10/09/2014