Hoje é, supostamente, um dia importante na minha vida. Faz hoje precisamente 7 anos que prestei provas públicas de Doutoramento, quando as inscrições se faziam por 5 anos. Portei-me bem e cumpri o prazo, entreguei a tese um mês antes do prazo e esperei 9 longos meses pela defesa. Os membros do júri estavam deslocalizados entre o Alentejo (Universidade de Évora), Minho (Universidade de Braga) e Lisboa (Universidade Autónoma de Lisboa, Universidade Lusófona e ISCTE), sendo que alguns viajavam e nem sempre estavam em Portugal.
Foi, eventualmente, uma das melhores épocas da minha vida. Escolhi um tema prazenteiro - a relação entre o turismo ecológico e o desenvolvimento sustentável em África - e que, de facto, me deu muito mais prazer do que as angústias inerentes a este tipo de processos. O mais difícil acabou por ser o campo de estudo. Por razões que agora nem importa referir, todo o projecto foi elaborado a pensar em Moçambique, país que me inspirou para a problemática do turismo. Mas depois, por enredos intrincados, mantive o tema e emigrei para São Tomé, deixando Moçambique para outras núpcias.
Fiz um interregno na actividade pedagógica, que já fazia as minhas preferências, e voei para o arquipélago dos meus sonhos, onde o turismo era uma actividade que tinha tanto de irregular como de potencial. E por lá fiquei uma longa temporada que permitiu fazer de tudo um pouco. Fiz a pesquisa assente em estudos de caso combinados, privilegiando o turismo em espaço rural, as roças, recorri a actividades ecoturísticas informais e fiz muitas caminhadas, segui de perto (muito de perto) o Ilhéu das Rolas, ainda não Pestana mas Rotas d'África/Rotas do Café, e as acções de conservação de tartarugas marinhas. Conheci pessoas fantásticas com as quais ainda hoje mantenho contacto (e outras menos de quem nem me quero lembrar, o que não é nada de extraordinário e faz parte da vida), passei momentos muito agradáveis, andei por todo a ilha - a pé, de carro, de canoa e de lancha. Não apanhei paludismo (aliás, estranhamente nunca apanhei em nenhuma das Áfricas por onde tenho andado). Ri muito, chorei um pouco, angustiei-me qb, sonhei e criei expectativas, senti que a vida passava por mim sem eu a conseguir agarrar mas também a abracei vezes sem conta. Numa palavra, vivi. E não há nada mais importante do que isso.
Regressei a Lisboa quando dei a pesquisa por concluída. Mas fui sempre, até hoje, voltando às ilhas dos meus sonhos e que têm um lugar guardado no meu coração. Sem ter passado por tudo o que por lá vivi, não seria a pessoa que sou hoje. Ao voltar terminei a tese, preparei a defesa e três dias antes das provas públicas vivi o impensável. O aparelho de ar condicionado da sala incendiou-se enquanto falava para ninguém contando os minutos de forma a não ultrapassar o tempo regulamentar previsto para estas apresentações. O início de noite do dia 12 de Março foi passado primeiro a apagar o fogo e depois a respirar com uma máscara de oxigénio na boca numa ambulância dos bombeiros. No dia 15 de Março de 2005 lá fui até ao Auditório Afonso de Barros no ISCTE, a conversar com meu Eu interior, acreditando que tudo estava a terminar. Uma fase que passava e o Mundo que se abria à minha frente.
A defesa correu bem (diria muito bem, mesmo). Depois da minha apresentação, como sempre com powerpoint que incluía esquemas, mapas e muitas fotografias, cumpriram-se os tempos de cada um (ainda eram tempos diferenciados para cada arguente), eu tentei defender-me o melhor que podia e sabia. Parece que bem. No final, nem realizei bem o que o Presidente do Júri queria dizer com "nota máxima por unanimidade" e menos ainda, o que o arguente principal (Professor Francisco Ramos) me dizia: "nos doutoramentos é comum os candidatos pensarem que com as provas públicas chegaram ao fim de um percurso. Mas o caminho começa aqui e agora, com mais responsabilidade e mais trabalho". Só percebi depois, quando fui buscar o certificado que a nota foi de facto máxima, não podia ser melhor, "distinção e louvor por unanimidade". E tenho vindo também a perceber o que é que o Professor Francisco Ramos queria dizer com "o caminho começa aqui e agora, com mais responsabilidade".
Faz hoje 7 anos, portanto, que a minha vida (re)começou, com menos tranquilidade e mais angústias, repleta de dúvidas existenciais que nem vale a pena materializar através da escrita. Faz hoje 7 anos que a vida nas ilhas dos meus sonhos foi ficando progressivamente mais longe de mim. Mas jamais longe do meu coração.