- Achas possível viver sózinho? – perguntou-lhe o coração de manteiga pelo qual ela se apaixonara uns anos antes e pelo qual ainda sentia um baque quando ele entrava numa sala sem que ela o esperasse, e que se desfazia com qualquer saia que passasse pelo seu campo visual, consciente dos estragos que provocava ou até involuntariamente e sem querer perturbar.
Mas aquele era talvez um dos homens mais naturalmente perturbados, que se dizia sensível às belezas femininas, que se encantava com qualquer rabo de saias e que se deslumbrava com qualquer tipo de beleza. Para ele não havia mulheres feias e muito menos desinteressantes. Em qualquer uma conseguia encontrar um sinal de arrebatamento que o fazia balançar, desengonçava e podia até desestruturar. Aquele era um homem emocionalmente muito desorganizado e ela que procurava, antes de mais, orientar-se. Tinha até a mania de oferecer bússolas aos amigos porque era uma forma de reconhecer os pontos seguros da sua vida. Pois àquele nunca oferecera nenhuma, talvez o mal estivesse mesmo aí...
- Já alguma vez te apaixonaste de forma tão intensa que eras capaz de largar a vida que tens por esse sentimento e para correres atrás do motivo do teu desassossego? Já te sentiste fundir noutra pessoa e ser capaz de qualquer loucura por ela? – respondeu ela com a consciência que estava a ser traída pela sua própria voz, que soava a desilusão contida, resultado de uma expectativa alimentada durante anos.
Ele olhou-a e encolheu os ombros sem perceber ao certo o que ela queria dizer com aquilo...